Na sua excelente coluna de quinta-feira (21), Roberto Dias cravou uma estaca de madeira no mundo político, ao decretar: “Da elite política, a que faz rodar o mar de lama, é que evidentemente não aparecerá nenhuma saída digna –está aí a discussão da reforma eleitoral para provar isso”.

De acordo, Dias, até porque não é só a reforma política o motivo para descrer dos políticos, ressalvadas as exceções que apenas confirmam a regra.

Se a saída digna não sairá dos políticos –e menos ainda dos militares, pelo menos para o meu gosto–, o que sobra?

Sobram os atores que, na mesma quinta-feira, apareceram por pura coincidência em textos da sempre excelente Sylvia Colombo, nesta Folha, e do escritor e jornalista mexicano Jorge Zepeda Patterson, em “El País”.

Sylvia registrou o surgimento de uma sociedade civil no México, a partir do terremoto de 1985, que foi de novo essencial na mais recente devastação. Recuperou texto de Carlos Monsiváis, lendário escritor mexicano, para o livro “No sin Nosostros”, em que o autor escreve: “Com rapidez, destreza e desprovida de preconceitos de classe, a sociedade criou albergues, reuniu alimentos e roupa, coletou dinheiro, armou redes para localizar pessoas, resgatou mortos e vivos dos escombros, demoliu ruínas que ainda representavam risco e deu contenção emocional e psicológica às vítimas”.

Ecoa agora Jorge Zepeda Patterson: “O sismo que torpedeou a cidade este 19 de setembro pôs à prova a alma dos habitantes da capital e mostrou ao mundo as razões pelas quais esta cidade sobreviveu durante séculos em um vale construído em meio ao lodo e permanentemente sufocada pelo desafio de conseguir e trasladar água a uma urbe a 2250 metros de altura”.

Fecha assim: “A tragédia mostrou, uma vez mais, que o melhor deste lugar são seus cidadãos”.

Se a elite política fracassou –e, ainda por cima, a elite empresarial tampouco parece oferecer a “saída digna” cobrada por Roberto Dias, como ele deixou claro na sua coluna– e se a sociedade civil demonstra tantas virtudes nas horas críticas, seria ela a solução também para a política?

Seria se o distinto público se dispusesse a tirar o bumbum da cadeira e mobilizar-se para cobrar políticas públicas capazes de, com o devido tempo, remover ou pelo menos reduzir as mazelas que infernizam o Brasil (no México não é essencialmente diferente).

O problema é que, no Brasil, a sociedade civil comporta-se como cometa: aparece de repente em algum momento (diretas-já, fora Collor, a explosão de 2013 e alguns poucos mais) e, tão rapidamente como apareceu, se encolhe e deixa tudo nas mãos de uma classe política desmoralizada.

Se houvesse terremotos no Brasil, sou capaz de apostar que haveria uma mobilização parecida como a que Jorge Zepeda louva no México. Prova: as cenas de solidariedade explícita que são vistas quando de enchentes, desabamentos, desastres.

Nada contra a solidariedade, ao contrário. Mas ela seria muito mais eficiente se a sociedade se mobilizasse não só para ajudar as vítimas dos desastres do presente mas também para cobrar providências capazes de evitar ou ao menos minimizar os danos provocados por desastres futuros.

É fazer política, na melhor acepção da palavra, a única maneira, aliás, de retirar a conotação negativa que a palavra acabou adquirindo. Ainda por cima, seria a melhor maneira de evitar que apareçam mais trogloditas propondo intervenção militar.

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FONTEFolha de São Paulo
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