No tocante à política de saúde pode-se dizer que esta emergiu de acordo com as manifestações da sociedade, na demanda de ações de higiene e saneamento […]. Durante o século XVI, as preocupações e ações de saúde sinalizadas na Europa, foram traduzidas em um esforço para a educação e coleta do lixo nas ruas. Nesse mesmo século, já existia o “limpador de rua”, que removia os depósitos de lixo em sua carroça com o fim de utilizá-lo como fertilizante. (MACÊDO, 2004).

Eixo galo branco – primavera, zona sul, SRN/PI. 2016-2017 “dentro do mato”

CARTA ABERTA

Desde que voltei para São Raimundo Nonato/PI – em meados de 2012, tenho percebido que ainda existe por aqui, certa dificuldade no tocante à educação popular e organizacional (público e privado) quando se refere ao manuseio e à coleta do lixo, isto é, dos resíduos sólidos e líquidos. Esse quadro traduz o quanto uma boa parte de nós ainda está apegada à cultura nociva de “jogar o lixo no mato”, que tem causado riscos e danos à saúde da população ao longo dos anos, até mesmo porque, o acúmulo do lixo não proporciona somente criadouros de mosquitos, mas diversos outros veículos que causam patologias infectocontagiosas e parasitárias significativamente preocupantes.

Por outro lado, considerando o período entre 2012 e 2014, um período em que estive debilitado e impotente no desenvolvimento de ações (questões de saúde) – observei com admiração e respeito – atitudes de 2 mulheres: uma enfermeira e a outra gerente de loja (nomes preservados), que chegavam da sua luta profissional e se dedicavam a desobstruir esgotos a céu aberto e a varrer uma boa parte da nossa rua. Sabe Luan, ainda que eu estivesse no repouso depois de derrubar o câncer em 3 locais de meu corpo, me sentia inerte perante a atitude louvável destas duas jovens senhoras.

Com a dificuldade cotidiana no que diz respeito ao controle, organização e coleta na cidade, com um olhar pras bandas de cá: zona sul, eixo galo branco-primavera, comecei a me envolver com a problemática dentro das minhas possibilidades e limitações, a passos gradativos, para não correr o risco de adoecer ou abusar, daí, parar o que iniciaria como uma observação participante.

Foi no período compreendido entre 2014 e 2015 que despertei para o diálogo com os servidores do sistema de coleta por aqui. Naquele momento, indiscutivelmente, afirmo o quão foi relevante a atitude do motorista (nome preservado) que fazia este território, inclusive, com o apoio da equipe. Todos começaram a se desdobrar mais – por atitude, por querer fazer, sem algum reconhecimento das políticas públicas e sociedade de forma geral.

Mais uma vez, o diálogo entre comunidade e servidores aparece como instrumento fundamental para o desenvolvimento social e econômico. Tem sido assim para o meu entendimento, em 19 anos de trabalho socioeducativo, nos estados da Paraíba e Piauí. Vale ressaltar que, o ganho coletivo é bem maior quando a parceria ou o diálogo é realizado também com a imprensa e a gestão pública no cenário em que se desenvolvem quaisquer ações.

Pois bem, foi então que – em 2016, com as dificuldades que o sistema de coleta municipal atravessava, com o continuísmo da cultura de “jogar o lixo no mato” somado ao envolvimento pessoal, procurei intensificar as ações e despertar para as conversas de terreiro, de calçada, de quem passava na rua, com o objetivo de atentar para uma espécie de consciência comunitária, tudo isso, com moderação, através de práticas pontuais, a passos gradativos e firmes, sem “autocobrança”, de boa, até mesmo, para não desandar.

Neste período, 2016 e início do ano de 2017, eu transitava entre o bairro primavera e o lixão da nossa cidade, para descartar os resíduos que eu coletava de forma seletiva e quinzenal (aproximadamente) em locais do eixo galo branco-primavera. Apesar de já perceber uma melhora no serviço (pras bandas de cá) a partir da 3ª semana do mês de janeiro de 2017.

Lixão – SRN/PI. 2016 e início de 2017 “idas e vindas”

Como acredito no diálogo como ferramenta social, tratei logo de fazer amizade com a equipe que chegava a nossa comunidade – em janeiro/2017. Observava, colocava o lixo ou não em locais estratégicos para testá-los. Não houve decepção por aqui, enquanto observei, por vezes de perto, por vezes de longe, sem eles saberem. Daí, a partir das observações, inclusive, no tocante a assiduidade e a pontualidade, senti força e coragem para – na cara de aço – convidá-los, quando possível, para ajudar na coleta ou campanha que se iniciava por aqui e que envolveria saúde e meio ambiente. 10 minutinhos de coleta fora da obrigação deles.

A importante contribuição dos servidores – ações pontuais rápidas em dias de coleta regular
A importante contribuição dos servidores – ações pontuais rápidas em dias de coleta regular
A importante contribuição dos servidores – ações pontuais rápidas em dias de coleta regular

Por vezes, chegaram a passar mais cedo (a coleta começa por aqui) ou até mesmo dentro do horário, sob o método do improviso, assim, contribuíram com nossa campanha algumas vezes durante o ano, porque a campanha é de todos, basta cada um querer abraçá-la. Ou seja, apenas comecei a AÇÃO, só haverá continuidade se for acolhida. SOMAR para MELHORAR: ação social em saúde & meio ambiente. É importante ressaltar que, no processo constitutivo da sociedade e/ou da cidadania, precisamos considerar a tríade: colaborar-reconhecer-reivindicar.

Reconhecemos o trabalho do sistema de coleta municipal pras bandas de cá (atualmente – com o carro compactador); reconhecemos em especial, o empenho dos servidores, a pontualidade, a assiduidade e a disponibilidade sem perde tempo. Cumprem o seu papel, as atribuições que lhes cabem, ao passo que também influenciam o desmantelamento das sociopatologias no âmbito urbano. Podemos citar também, o trabalho desenvolvido pelos AGENTES na área de endemias, que têm se desdobrado para reverter o quadro epidemiológico da cidade (conto em outra oportunidade).

Tocaia: ação improvisada – contratei serviço de limpeza logo cedo, antes do horário da coleta municipal, para aproveitar o serviço disponibilizado. Zona sul, SRN/PI, 2017.

Mesmo assim, sabemos que estas e outras ações institucionais, bem como, as ações desenvolvidas por nós, moradores de São Raimundo Nonato, se tornam pequenas quando comparadas à prática cotidiana de “jogar o lixo no mato”, quando não se sabe o que fazer com O LIXO NOSSO DE CADA DIA, apesar de uma boa parte de nós, já contar com um calendário de coleta local. Por outro lado, ainda não visualizo apoios gerais a projetos e campanhas que tratem da questão em foco. A Responsabilidade Social está em ALTA, para qualquer tipo de organização, seja governamental ou não.

Torço a cada dia por uma evolução social em São Raimundo Nonato, o ganho é coletivo. E se é coletivo, estou dentro! A partir de ações socioeducativas o quadro poderá melhorar em qualquer realidade, inclusive, aqui. Sobretudo, uma andorinha sozinha não faz verão, muito menos EU. Mas estou por aqui, para colaborar dentro dos meus limites e possibilidades, é claro.

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